– Cacete, o teu pênis é muito lindo, vizinho.
– Como?
– O teu pênis é muito lindo, vizinho.
– Mas como você entrou aqui?
– Sei como, vizinho: arrombei portas, portões. Assoviei para os cachorros. O porteiro emprestou-me sua chave mestra e não tenho que te dar satisfações. E não fique abstrato.
– Mas eu tenho nome, vizinha. Estou tomando banho. Você flutua por aí e tenta iludir meu pênis.
– O lixeiro não veio: deixei calcinhas ensanguentadas, revistas Capricho, seda, latas de azeite, de maionese, de leite condensado, um siso, possíveis poderes podres, bugigangas novas, emplastros, tosses... e lembrei-me do teu pênis lindo.
– Mas, vizinha, tenho nome e tento tomar um banho. Meu pai morreu ontem.
– De quê?
– De sossego, sortilégios, ladainhas ou sapinho, não sei.
– O teu pênis ainda está lindo, mesmo cheio de espuma desse sabonete barato, meu gostozíssimo vizinho.
– Minha vizinha folgada, ainda vou ao botequim.
– Passei na Igreja agora; algumas ovelhas te chamaram de gay, outras disseram que eu sou uma piranha enrustida. Mas na esquina rolava um samba.
– Samba de raiz?
– Parecia até rock. Vamos pra Woodstock?
– Vizinha intrometida, preciso me enxugar. Dê-me licença.
– Vamos então pra Tocantinópolis, Machu Pichu, Gramado, Estocolmo, Melbourne, Parati, Casablanca, Natal...
– Vizinha, você fala demais... é tudo muito perto.
– Escuto o olor da ereção de teu pênis lindo e gostaria de estar mais próxima. Não penso em outros homens. Temo minhas responsabilidades.
– Aí, vizinha maluca, minha cara, tô meio perdido...
– Vamos ao McDonald’s comer um enlatado em conserva e tomar um chá... e... depois ajudá-lo-ei com esta toalha estúpida que encobre teu pênis lindo.
– Vizinha, tira a mão desta toalha!...
– Vamos ler uma história mórbida, vamos pro cangaço, ver quando Psiquê e Cupido cruzam, crer nos guardiões dos infernos.
– Vizinha, tira a mão da minha pica.
– Vamos tomar um porre de ponche. Comer pizza em uma cantina careta onde eu possa mostrar-lhe por debaixo da mesa minha buceta delineada, desenhada e estupenda? É que alguém me disse que você é um punheteiro e me deu um real para te sacanear. Será que você vale isso, vizinho?
– Vizinha, além de eu ainda estar nu e já te ter dito que tenho nome, vou te dizer que não valho nada. Mas pra que você me mostraria esta alvissareira buceta?
– É que alguém disse que sou bonita, mas que não presto, que sou relapsa, vagabunda, estéril, fofoqueira, intrínseca, matuta, imatura e sexy. Detalhe: posso ser tudo isso mas não tenho um pênis tão lindo quanto o teu.
– Não entendi muito bem, mas...
– Vem cá, vamos trepar com as várias mulheres do Chico?
– E a Marieta?
– Vamos gozar e amar e viver com a Anais?
– E o Henry?
– Importantíssimo vizinho de lindo pênis que pede para levantar-se, poderíamos desfrutar de um filme erótico qualquer e esquecer que existimos?
– E a Cicciolina?
– Vizinho, vamos ao Engenhão ver um jogo qualquer e, logo depois, a uma parada gay; vamos suar em um spa cheio de perobões...
– Não gosto de viados, sem ser o meu pai.
– E em um clube de luta livre ou de boliche? Sem o seu pai, com este teu pênis lindo e que ainda está meio úmido – deixa eu ver! – faríamos o maior sucesso.
– Vizinha, não me iniba, pois tenho família que não conheço para sustentar.
– Vamos, então, a algum camelódromo, à Vila Mimosa, àquele museu lá de Niterói, aos Arcos, ao Amarelinho, ao chão da praia...
– Vizinha, minhas moedas, minha disposição, meu Niemeyer, meu Fortuna, meu alcoolismo e minhas fobias aquosas estão incontroláveis, mas...
– Excepcionalíssimo vizinho, temos em comum o incomum: teu pênis é lindo, estou podre de tesão; você deixou de ler, eu já decorei o kama sutra; não vou mais a pubs babacas e você continua atormentado com os fantasmas dos bêbados que conheceu; bebo chá de cogumelos à noite e você somente chapa sozinho enquanto seu lindo pênis dorme; estou apavorante, você inútil; e não perdemos tudo que ainda temos a perder.
– Esculachadíssima vizinha, vamos que meu pênis lindo conseguiu uma pseudo ereção.
Dona Georgina chega, atrapalha aquele atrapalhado conluio sexual e explode: “Solte já este pênis lindo!”
Os donos de um estado abominável transam sem culpas e cheios de indecências e estão em transe. Aí, o pênis lindo desfalece e murmura:
- Ploft!
quinta-feira, 26 de janeiro de 2012
BUNDA SURREAL
– Pô, a tua bunda é muito linda, vizinha.
– Como?
– A tua bunda é muito linda, vizinha.
– Mas como?
– Não sei como, vizinha, mas ela deixa-me abstrato.
– Eu tenho nome, vizinho.
– O lixeiro passou agora: levou um monte de garrafas pet, alguns acontecimentos, uma porrada de lixo orgânico, mais um monte de vidros estilhaçados, poderes podres, papéis, escaninhos, escarros, constipações... e a tua bunda linda ainda ficou aí.
– Mas, vizinho, eu tenho nome. A minha mãe não tá muito legal.
– O que é que ela tem?
– Um AVC, um ECG, um DNA, não sei.
– A tua bunda continua linda, minha queridíssima vizinha.
– Meu vizinho, ainda vou à Igreja.
– Fui lá na esquina agora; tocavam um som...
– Forró?
– Parece que era.
– Forró é bonito, mas só se for o de pé de serra.
– Vamos para o interior?
– De onde, vizinho?
– Tiradentes, Caruaru, Amsterdã, Katmandu, Luanda, Havana, Corumbá, Xapuri...
– Para, vizinho! Mas é longe...
– Ouço o odor de tua bunda linda todos os dias e não acho longe. Duvido de minha masculinidade. As minhas responsabilidades foram-se.
– Aí, cara, vizinho, tô meio perdida...
– Vamos comer um pastel de palmito e tomar um caldo de cana... e... depois observarei a tua bunda linda.
– Vizinho!...
– Vamos ler uns livros, corromper o Universo, apaixonarmo-nos por Narciso e crer nos guardiões do céu.
– Vizinho!...
– Vamos tomar um gole de cachaça. Comer um ovo cozido pintado, redesenhado e redistribuído? É que alguém me pediu para comprar um pato e me deu um real. Será que dá, vizinha?
– Vizinho, além de eu já ter dito que tenho nome, vou te dizer que não sei. Mas pra que o pato?
– É que alguém já tem uma pata; agora, quer um pato. Detalhe: a pata não tem uma bunda tão linda quanto a tua.
– Ah, entendi.
– Mas, vem cá, vamos ao zoológico dar pipocas aos macacos?
– E o Raul?
– Podemos, então, acordarmos metamorfoseados?
– E o Franz?
– Querida vizinha de linda bunda, poderíamos, ao menos, sair dando porrada em adolescentes, estuprarmos algumas burguesas ou ficarmos apenas doidões?
– E o Stanley?
– Vizinha, vamos ao Maracanã ver um Fla-Flu, um Ba-Vi, um Gre-nal, um Atle-tiba, um San-São.
– Não gosto de futebol.
– E um Mogi-Mirim e Matsubara? Com a tua bunda linda, faríamos o maior sucesso.
– Vizinho, não teima, pois o meu dengo é muito relativo.
– Vamos, então, ao Observatório, ao Municipal, ao Bola Sete, ao Bola Preta, ao Sambódromo, ao Circo Voador...
– Vizinho, minha ciência, minhas artes, meu corpo, meus confetes, meu abre-alas e meu nariz estão indômitos, mas...
– Amabilíssima vizinha, temos alguma coisa em comum: tua bunda é linda, meu corpo é um estorvo; você gosta de poemas épicos, eu de Modesty Blaise; encontramo-nos quase sempre no mesmo pub, mas eu para beber e você para sacanear as almas psicografadas dos bêbados itinerantes; bebo vinho à noite e você somente toma um chá quando tua linda bunda permite; estou pavoroso, você deprimida; e temos tudo a perder se consolidarmos nossos mais escrotos instintos.
– Vulgaríssimo vizinho, vamos que minha bunda linda já esperneia.
Seu Paulinho chega, interrompe aquele coito, arrefece aqueles ânimos e apedreja: “Saia já desta bunda linda!”
O dono do estado pavoroso e a dona da imensa depressão estão em transe. Aí, a bunda linda reage:
- Pum!
– Como?
– A tua bunda é muito linda, vizinha.
– Mas como?
– Não sei como, vizinha, mas ela deixa-me abstrato.
– Eu tenho nome, vizinho.
– O lixeiro passou agora: levou um monte de garrafas pet, alguns acontecimentos, uma porrada de lixo orgânico, mais um monte de vidros estilhaçados, poderes podres, papéis, escaninhos, escarros, constipações... e a tua bunda linda ainda ficou aí.
– Mas, vizinho, eu tenho nome. A minha mãe não tá muito legal.
– O que é que ela tem?
– Um AVC, um ECG, um DNA, não sei.
– A tua bunda continua linda, minha queridíssima vizinha.
– Meu vizinho, ainda vou à Igreja.
– Fui lá na esquina agora; tocavam um som...
– Forró?
– Parece que era.
– Forró é bonito, mas só se for o de pé de serra.
– Vamos para o interior?
– De onde, vizinho?
– Tiradentes, Caruaru, Amsterdã, Katmandu, Luanda, Havana, Corumbá, Xapuri...
– Para, vizinho! Mas é longe...
– Ouço o odor de tua bunda linda todos os dias e não acho longe. Duvido de minha masculinidade. As minhas responsabilidades foram-se.
– Aí, cara, vizinho, tô meio perdida...
– Vamos comer um pastel de palmito e tomar um caldo de cana... e... depois observarei a tua bunda linda.
– Vizinho!...
– Vamos ler uns livros, corromper o Universo, apaixonarmo-nos por Narciso e crer nos guardiões do céu.
– Vizinho!...
– Vamos tomar um gole de cachaça. Comer um ovo cozido pintado, redesenhado e redistribuído? É que alguém me pediu para comprar um pato e me deu um real. Será que dá, vizinha?
– Vizinho, além de eu já ter dito que tenho nome, vou te dizer que não sei. Mas pra que o pato?
– É que alguém já tem uma pata; agora, quer um pato. Detalhe: a pata não tem uma bunda tão linda quanto a tua.
– Ah, entendi.
– Mas, vem cá, vamos ao zoológico dar pipocas aos macacos?
– E o Raul?
– Podemos, então, acordarmos metamorfoseados?
– E o Franz?
– Querida vizinha de linda bunda, poderíamos, ao menos, sair dando porrada em adolescentes, estuprarmos algumas burguesas ou ficarmos apenas doidões?
– E o Stanley?
– Vizinha, vamos ao Maracanã ver um Fla-Flu, um Ba-Vi, um Gre-nal, um Atle-tiba, um San-São.
– Não gosto de futebol.
– E um Mogi-Mirim e Matsubara? Com a tua bunda linda, faríamos o maior sucesso.
– Vizinho, não teima, pois o meu dengo é muito relativo.
– Vamos, então, ao Observatório, ao Municipal, ao Bola Sete, ao Bola Preta, ao Sambódromo, ao Circo Voador...
– Vizinho, minha ciência, minhas artes, meu corpo, meus confetes, meu abre-alas e meu nariz estão indômitos, mas...
– Amabilíssima vizinha, temos alguma coisa em comum: tua bunda é linda, meu corpo é um estorvo; você gosta de poemas épicos, eu de Modesty Blaise; encontramo-nos quase sempre no mesmo pub, mas eu para beber e você para sacanear as almas psicografadas dos bêbados itinerantes; bebo vinho à noite e você somente toma um chá quando tua linda bunda permite; estou pavoroso, você deprimida; e temos tudo a perder se consolidarmos nossos mais escrotos instintos.
– Vulgaríssimo vizinho, vamos que minha bunda linda já esperneia.
Seu Paulinho chega, interrompe aquele coito, arrefece aqueles ânimos e apedreja: “Saia já desta bunda linda!”
O dono do estado pavoroso e a dona da imensa depressão estão em transe. Aí, a bunda linda reage:
- Pum!
DUAS MOÇAS
sob o sol
em Itacuruçá
ou em Ibicuí
duas moças
procuram tatuís
“eles não estão aqui.
vamos achá-los atrás das moitas.”
correm
como cavaleiras selvagens
como dionisíacas hipólitas
as suas tanguinhas inibidas
sentem o cheiro bom do mar
a maresia carente
esgueiram-se
em meio a tufos de mata virgem
entre salinas salientes
agora dão-se as mãos cálidas
“cadê os bichinhos?
vamos mais além.”
arrebenta-se o mar
nas pedras cristalinas
a vaga às vezes saboreia os pés
das duas moças
fogem da selvageria litorânea
continuam calmas e se tocam
“você tocou nos meus seios...
só quis ajeitar sua alça.”
as duas moças
que estão decepcionadas com o mundo
reconhecem suas purezas
instigam suas intimidades
os jatos de areia amaciam suas pernas
o sol as banha
sentadas
hipnotizadas
“o mar está estupendo...
você também.
vamos nadar?
nuas.
nuas?
eu tiro as suas roupas.
e eu?
as minhas.
você me alisou?
alisei.
você me roçou?
rocei.
você demorou muito
com essas mãos em meu biquíni.
demorei
e foi bom.
você me beijou.
foi muito bom.
e você?
o que é que tem?
ainda está vestida e...
e...
e o mar está estupendo.
me dispa.
não tem ninguém olhando?
você já está nua.
você me beijou de novo.
e você estremeceu.
posso te alisar?
alise.
posso te roçar?
roce.
minhas mãos demoram-se
em tirar o seu biquíni.
demore-se mais
que vai ser bom.
vou beijá-la.
vai ser muito bom.”
duas moças
reinventam o paraíso
a serpente sai correndo desesperada
Adão retira a última folha de parreira
de Eva
Caim desiste de matar
Abel
Deus descansa enfim
em Itacuruçá
ou em Ibicuí
duas moças
procuram tatuís
“eles não estão aqui.
vamos achá-los atrás das moitas.”
correm
como cavaleiras selvagens
como dionisíacas hipólitas
as suas tanguinhas inibidas
sentem o cheiro bom do mar
a maresia carente
esgueiram-se
em meio a tufos de mata virgem
entre salinas salientes
agora dão-se as mãos cálidas
“cadê os bichinhos?
vamos mais além.”
arrebenta-se o mar
nas pedras cristalinas
a vaga às vezes saboreia os pés
das duas moças
fogem da selvageria litorânea
continuam calmas e se tocam
“você tocou nos meus seios...
só quis ajeitar sua alça.”
as duas moças
que estão decepcionadas com o mundo
reconhecem suas purezas
instigam suas intimidades
os jatos de areia amaciam suas pernas
o sol as banha
sentadas
hipnotizadas
“o mar está estupendo...
você também.
vamos nadar?
nuas.
nuas?
eu tiro as suas roupas.
e eu?
as minhas.
você me alisou?
alisei.
você me roçou?
rocei.
você demorou muito
com essas mãos em meu biquíni.
demorei
e foi bom.
você me beijou.
foi muito bom.
e você?
o que é que tem?
ainda está vestida e...
e...
e o mar está estupendo.
me dispa.
não tem ninguém olhando?
você já está nua.
você me beijou de novo.
e você estremeceu.
posso te alisar?
alise.
posso te roçar?
roce.
minhas mãos demoram-se
em tirar o seu biquíni.
demore-se mais
que vai ser bom.
vou beijá-la.
vai ser muito bom.”
duas moças
reinventam o paraíso
a serpente sai correndo desesperada
Adão retira a última folha de parreira
de Eva
Caim desiste de matar
Abel
Deus descansa enfim
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